As irmãs Eva e Ema Klabin tinham em comum um depurado gosto pela arte, que resultou em duas magníficas coleções. A exposição Universos Sensíveis é a reunião dessas duas coleções, que estão entre os mais importantes acervos de arte clássica em museus brasileiros.

As duas coleções, em seu conjunto, cobrem mais de 3.500 anos de história, propiciando uma visão abrangente da história da arte – do Egito antigo aos mestres da Escola de Paris, passando pela arte Greco-Romana, arte Chinesa de diferentes dinastias, arte Renascentista, pinturas Flamengas e Holandesas do século XVII, Barroco Brasileiro, pintura Inglesa do século XVIII, Modernismo Brasileiro e arte Africana. Compreendem, ainda, finíssimas peças de arte decorativa como tapetes, mobiliário, prataria, cristais e porcelanas, assim como livros raros.

Abrigadas usualmente nas duas casas museus que levam os nomes de suas fundadoras –  Casa Museu Eva Klabin na Lagoa, Rio de Janeiro, e Casa Museu Ema Klabin, nos Jardins, São Paulo –, as peças selecionadas para a exposição saíram pela primeira vez de suas casas para serem mostradas a um grande público, tendo sido apresentadas na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, e no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Um exercício desafiador e instigante, sem dúvida, já que abriu a possibilidade de dar maior destaque individualmente a cada uma das peças, mas, ao mesmo tempo, impôs o dilema da escolha para que, fora de seus contextos de conjunto nas casas museus, as obras dessem conta de apontar para o todo.

O requinte e a excelência desses acervos serviram de inspiração e motivação para a realização da mostra, que buscou proporcionar uma maior divulgação das casas e de suas coleções, mostrando o perfil e trajetória das irmãs colecionadoras e a forma como esses magníficos acervos foram constituídos.

EVA KLABIN

 

Eva Klabin nasceu em São Paulo em 1903. Foi a primeira das três filhas dos imigrantes lituanos Fanny e Hessel Klabin. Seu pai foi um dos fundadores das indústrias Klabin de Papel e Celulose. Ela começou a colecionar desde cedo, hábito que herdou do pai, apreciador de peças de prata. Casou-se, em 1933, com o advogado Paulo Rapaport, austríaco naturalizado brasileiro, trocando São Paulo pelo Rio de Janeiro, cidade na qual viveu até o final de sua vida. O casal não teve filhos. Em 1957, Eva ficou viúva e recolheu-se por algum tempo. Passado o luto, reintegrou-se à vida social, recuperando a alegria de viver e o entusiasmo pelo colecionismo.

Em suas frequentes viagens, passou a se dedicar com desvelo à procura de obras de arte que viriam ampliar sua coleção, então em fase de plena expansão. Adquiriu peças em antiquários paulistas e cariocas bem como em reputadas casas de Roma, Paris, Londres, Zurique, Viena, Madri ou Barcelona e outras tantas arrematadas nos leilões de Buenos Aires, Londres e Nova York. O fascínio pelo Oriente resultou em viagens ao Japão, à China, à Birmânia, à Tailândia, à Índia, à Indonésia e a Singapura, durante as quais raros e belos objetos foram adquiridos, constituindo o núcleo oriental da coleção.

Anfitriã requintada, fez de sua casa e coleção o cenário ideal para recepcionar personalidades de grande expressão nacional e internacional, entre as quais o ex-presidente Juscelino Kubitschek, o israelense Shimon Peres e os norte-americanos David Rockfeller e Henry Kissinger, ex-secretário de Estado. Amiga de Burle Marx, suas festas eram conhecidas pela sofisticação, principalmente dos arranjos florais, especialmente criados em sua homenagem, pelo amigo paisagista.

Apaixonada por música, fez construir em sua residência na Lagoa um Sala de Concertos com um piano de cauda trazido especialmente da Europa. Em ocasiões especiais, ali apresentavam-se musicistas de renome nacional e internacional, para o deleite de seus convidados.

EMA KLABIN

 

Ema Gordon Klabin nasceu no Rio de Janeiro em 1907. Como a irmã Eva, foi educada no Brasil e na Europa (Alemanha e Suíça), onde residiu durante a Primeira Guerra Mundial.

Além da atividade empresarial, assumida em 1946 com a morte do pai, dedicou-se a inúmeros trabalhos filantrópicos e assistenciais, dentre os quais se destaca seu empenho na construção do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Apreciadora de música e arte, teve uma significativa atuação na vida cultural da cidade, com a participação nos conselhos de instituições culturais, além de promover artistas e participar de leilões beneficentes em prol das entidades que apoiava.

A partir do final dos anos 1940, passou a adquirir importantes obras de arte em várias galerias europeias e americanas, além de comprar peças de colecionadores brasileiros e de diplomatas estrangeiros de passagem pelo País. Com o acervo reunido começou a acalentar o sonho de construir uma residência onde pudesse conviver com as obras adquiridas e receber familiares, amigos e artistas em ambiente refinado. A casa, feita sob medida para abrigar sua coleção, foi inaugurada no final da década de 60.

UNIVERSOS SENSÍVEIS | 2004

 

Realizada em 2004, a exposição Universos Sensíveis ocupou a Pinacoteca do Estado de São Paulo, de 17 de março a 09 de maio e o Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, de 1º  de junho a 1º de agosto.

As cerca de 350 peças foram distribuídas pela exposição em três núcleos e diversos módulos.

Logo na chegada, dois magníficos anjos de madeira do barroco italiano, presos como se estivesse flutuando, davam as boas-vindas ao visitante.

ENCONTRO DAS COLEÇÕES

Em seguida, na primeira grande sala, o visitante se deparava com uma magnífica reunião de peças de ambos os acervos, de diversas épocas e procedências, em uma bela composição que fazia antever a magnitude do que viria em seguida.

Neste primeiro ambiente, encontravam-se ainda painéis com fotos e a cronologia da vida das irmãs e duas vitrines contendo alguns objetos ilustrativos, como certificados de autenticidade de obras de arte, antigos livros e catálogos de exposições, fotografias estampadas em jornais e alguma correspondência, como as da fundação J. Paul Getty e da casa de leilões Sotheby’s para Eva Klabin.

Após essa convergência, seguiam-se os dois núcleos principais da exposição, cada um dedicado à coleção de uma das irmãs.

EVA KLABIN | O ESPELHO E O RELÓGIO

Passando para o núcleo de Eva Klabin, o visitante se deparava, logo na entrada, com um imponente relógio francês do século XIX, ricamente trabalhado, cujos ponteiros marcam as horas no sentido contrário. E a mostra de seu acervo se encerrava com um outro relógio, do século XVIII, este com as horas dispostas na sua ordem normal, uma alegoria da peculiar relação de Eva com o tempo e seus hábitos noturnos, costumando trocar o dia pela noite, bem como uma referência ao círculo do tempo criado pela coleção, encerrado entre o presente e a origem da arte. Nessa última sala o visitante se deparava também com um espelho onde podia ver sua imagem refletida, em meio a inúmeros retratos, gerando uma reflexão sobre o sentido da construção da identidade, buscado pela colecionadora.

Os módulos da exposição da coleção Eva Klabin mostram o que foi chamado pelo curador de “círculo mágico” de uma coleção, em referência à Walter Benjamim no seu texto sobre colecionismo.

O primeiro, “A arte como origem”, apresentava a arte clássica, com esculturas greco-romanas, vidros arqueológicos, peças do Egito antigo, objetos orientais das dinastias Shang, Chou e Han, além de exemplares de cerâmica pré-colombiana.

O módulo “A maternidade como origem” trouxe para a exposição uma das predileções de Eva Klabin e uma das características centrais da sua coleção: a presença expressiva do tema da maternidade, encontrada em inúmeras pinturas e esculturas de Madonas que se espalham pelos diversos ambientes da Casa Museu.

E, por fim, o módulo “A identidade como origem”, deu espaço ao gênero retrato, privilegiando a questão da construção da identidade e apresentando retratos do maneirismo italiano, do barroco holandês e da época de ouro da retratística inglesa no século XVIII.

EMA KLABIN | FRAGMENTOS DE UMA SINFONIA

O núcleo da coleção de Ema Klabin, por sua vez, começou com o módulo “A tradição europeia”, apresentando um riquíssimo conjunto de pinturas, esculturas, desenhos e objetos europeus, da antiguidade ao século XVIII.

O módulo “O contraponto oriental” trazia a belíssima coleção reunida por Ema em suas viagens, com peças representantes de diversas culturas orientais, de variados períodos.

O módulo “Raízes brasileiras”, mostrou ao público as raríssimas peças de Mestre Valentim, oriundas da antiga igreja de São Pedro dos Clérigos, no Rio de Janeiro, demolida na década de 1940 para a abertura da avenida Presidente Vargas, além de revelar o gosto de Ema Klabin pelo modernismo brasileiro, tão presente em sua coleção com obras de Brecheret, Portinari e Di Cavalcanti.

O último módulo da exposição, “Últimas aquisições: novas direções”, mostrou a peça mais valiosa da coleção, À la campagne, de Marc Chagall, além de outras pinturas modernas, peças pré-colombianas, e a imponente coleção de esculturas africanas que vieram a fazer parte da coleção.

REENCONTRO DAS COLEÇÕES

Ao final da exposição do MNBA, as duas coleções se reencontravam através do olhar que atravessava a sala onde estavam expostas as embalagens para transporte das obras e era possível vislumbrar, da última  sala de cada uma das alas da exposição, a coleção da outra irmã, unidas por num círculo mágico criado por seus  Universos Sensíveis.

A exposição Universos Sensíveis, que comemorou os 105 anos das Indústrias Klabin, foi vista por cerca de 65 mil visitantes e produziu uma bela publicação que proporciona a um público maior, ainda hoje, o prazer de ver essas duas magnificas coleções reunidas.

Créditos da exposição

 

Museu Nacional de Belas Artes

Curadoria Eva Klabin
Marcio Doctors

Curadoria Ema Klabin
Paulo de Freitas Costa

Coordenação
Ana Regina Machado Carneiro

Produção
ARTVIVA Produção Cultural
Clarisse Magalhães
Teresa Falcão

Assessoria de Comunicação e Imprensa
Meio Imagem: Ana Lígia Petrone

Expografia
Gerardo Vilaseca

Projeto de Iluminação
Be Light: Samuel Betts

Museologia
Equipe da Fundação Cultural Ema Gordon Klabin
Equipe da Fundação Eva Klabin
Equipe do Museu Nacional de Belas Artes

Montagem
Alessander Batista de Souza (MNBA)
Paulo César Silva (FEK)
Renato Cecílio das Dores (MNBA)

Pinacoteca do Estado de São Paulo

Curadoria Eva Klabin
Marcio Doctors

Curadoria Ema Klabin
Paulo de Freitas Costa

Coordenação Exposições Temporárias
Regina Franco Viesi

Museologia
Equipe da Fundação Cultural Ema Gordon Klabin
Equipe da Fundação Eva Klabin
Equipe do Museu Nacional de Belas Artes

Produção
Miriam Sasaki
Rita Torquete
Stefano Bruzzone

Assessoria de comunicação e imprensa
Diógenes Moura
Marcos Jungi

Expografia
Hiromu Kinoshita
Gerardo Vilaseca

Programação Visual
Cláudio Nakai

Montagem
Mário Bibiano (Coord.)
Arlindo P. Bezerra
Fabio Augusto T. de Paula
Flavio da Silva Pires
José Carlos Gabriel
Paulo César da Silva (FEK)